ADAUTO CARVALHO

Adauto José de Carvalho Filho 

Lamentavelmente, o parlamento brasileiro reflete a imaturidade política da sociedade. Não é um parlamento. É um parlamente. Uma geração de parlamentares que não tem virtude e valores, nem ética ou moral, tampouco ideologia. Quando os partidos se tornam agremiações, a falência da República se escancara diante dos nossos olhos. A sessão legislativa para aprovação do impeachment da Presidente da República mostrou o despreparo dos nossos parlamentares. Oposição e situação reduziram a democracia ao nada que eles tão bem protagonizam e expôs, também, o quanto estamos distante de uma democracia forte e que represente o povo. Não entrarei no mérito do processo de impeachment, não é relevante. Mas, tentarei mostrar alguns aspectos que denotam a teatralidade política brasileira. Pelo mostrado em plenário em exaustivas seis horas de sessão, os nossos parlamentares, vênias a algumas exceções, não sabem interpretar a Constituição Federal e não estavam preparados para uma votação tão importante e os argumentos levantados vão de uma superficialidade idiotizada a vazios gritos de uma ideologia superada e ultrapassada.

O objetivo da sessão legislativa era a admissibilidade ou não do processo de impeachment e não havia espaço para, naquele momento, se falar em julgamento, que será feita no Senado, o próximo passo a ser cumprido, conforme dita a Constituição. A superficialidade e o anacronismo mostraram a fragilidade do sistema político que perece nas mãos de pessoas despreparadas e inconsequentes. A qualidade dos nossos parlamentares chega ao limite da irresponsabilidade, mas são os nossos representantes e colocamos, em suas mãos, o destino do país. O voto fechado por partido, com ameaça de expulsão dos dissidentes, é uma aberração do nosso sistema político tendente à formação de igrejinhas. O parlamentar é o representante do povo e o poder a ele delegado não pode quedar-se pelo coletivismo partidário, como se o parlamentar não tivesse tirocínio para cumprir o seu poder eletivo. Em sentido contrário, também não é submisso a ideologias que se mostram, no decurso do tempo e nos exemplos de outras nações que palmilham os mesmos caminhos e que hoje são submetidas a um célere processo de desorganização social e econômica e pautadas pelo caudilhismo político. O pêndulo é o povo. É a ele que os parlamentares são submissos e a leitura das ruas, em um sistema polarizado pelos cordões do bem e do mal, ambos escondidos na hipocrisia das falsas ideologias partidárias, não é uma atividade simples e exige o mínimo de brasilidade. O povo foi às ruas. Os movimentos pró e contra impeachment se tornaram clamor e esse clamor deveria ser interpretado livremente pelo paramentar em seu voto, mas, infelizmente, isso não aconteceu. Vários parlamentares, de ambos os lados, foram cerceados em suas liberdades.

E o que se poderia interpretar pelas inúmeras manifestações populares? Quando observamos a política, além da própria política, desnudando os excessos e a passionalidade, a escolha do povo pode ser mais facilmente visível. Um aspecto importante é a espontaneidade das manifestações e os seus apelos. O país não é possessão de ninguém. O país é do povo. Não cabem ameaças nem negações da própria democracia enrustidas na práxis política deformada e tendenciosa. O cidadão não que ter sua casa invadida por ninguém. Sua casa é seu reino e um partido não tem o direito de ameaçar a liberdade do povo e nem tolher o direito constitucional de ir e vir e apostar nas desordens orquestradas para fazer valer uma falsa tendência política ou uma imposta ideologia. Longe de impor sentido ao certo e o errado, ao bem e o mal, acho que a análise da conjuntura atual acresceria alguns juízos de valor à capacidade de discernimento dos parlamentares e embasados em fatos e números. Como está o Brasil e quais as expectativas e perspectivas. É uma análise “hominis”, não há ética coletiva.

Outro aspecto importante é a corrupção. Eu volto a afirmar que as instituições não são corruptas. A corrupção é comum ao homem. Ser honesto ou corrupto é uma opção e uma práxis e, no conjunto da obra, a disputa é acirrada. Os três poderes da República são incestuosamente corruptos ao ponto do desrespeito a sociedade e aos ditames da convivência mínima com a ética e a moral. Todos são culpados e cúmplices e a negação disso seria fugir do óbvio. Os fatos apontam para o atual governo por serem mais recentes e, em ambas as partes, situação ou oposição, os rastros de lama apodrecem o país e a convivência com pessoas corruptas de “carterinha” é comum aos dois lados e desmerece as defesas alegóricas feitas com superficialidade ou arrogância. Os últimos dias mostraram até que ponto as autoridades levam a corrupção às últimas consequências e o que são capazes de fazer para manter o poder, que passa a ser visceral. As autoridades brasileiras não sobrevivem sem a corrupção. A deformidade virou vício, o vício virou a mais odiosa realidade.

Um termo que deu ibope e foi utilizado pela maioria dos votantes foi “hipocrisia”. Não sei se eles sabem o significado, mas, pelo sentido conotativo com que a utilizaram mostra a dissimulação de um parlamento podre. Hipocrisia, pelos velhos dicionários e pelo inovador google, é o ato de fingir que se tenha qualidades, idéias ou sentimentos que na realidade não se possui.. E aí caro leitor só há uma conclusão, todos são hipócritas! Hawthorne Nataniel, em sua obra “A Letra Escarlate”, argumenta que “ninguém pode, por muito tempo, ter um rosto para si mesmo e outro para a multidão sem no final confundir qual deles é o verdadeiro”. Aí está o desafio, quem deles seria verdadeiro? Por enquanto aposto em nenhum. Na República das falsidades ideológicas, a falsidade dos homens do poder é o única e desprezível maldade que desafia o país. Para Paolo Mantegazza, “não há hipócrita que saiba resistir ao exame de uma longa ou paciente observação, e o trabalho dissimulado de um ano perde-se na distração de um minuto”. Não seria tal exposição que assistimos durante as votações? Lamentavelmente, o cheiro de lama fluía da boca de cada um e as leviandades das argumentações feriram de morte a democracia brasileira. Concluo invocando Victor Hugo, grande escritor francês, que nos deixou de legado uma pérola que talvez, profeticamente, tenha sido escrita para os nossos parlamentares, como se tivessem honra suficiente para tanto: “o que caracteriza as pessoas que exibem exageradamente a sua virtude é que, quanto menos ameaçada está a fortaleza, mais guardas lhe põem”. Eu sou um simples cidadão e nunca pretendi ameaçar o reino de ninguém, como não admito que o meu reino, o meu país, seja ameaçado por atitudes e posicionamentos não republicanos de quem quer quem seja. Nada devo aos homens públicos brasileiros. A minha arma sempre foi o trabalho, mas minha cidadania me autoriza a cobrar honestidade de todos e afirmar que não somos um país de ladrões, embora os exemplos visíveis atentem contra a honestidade da nação e os homens que deveriam ser exemplos se quedem às negociatas e tenebrosas transações feitas com o que lhes é mais comum: a corrupção endêmica e generalizada. Lamentavelmente, não temos uma parlamento, mas um parlamente, onde a mentira é a única expressão utilizada por todos para a grande enganação nacional.

Adauto José de Carvalho Filho – AFRFB aposentado, pedagogo, Contador, Bacharel em Direito, Consultor de Empresas, Escritor e poeta.

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